As duas chávenas
Fico-me a meditar
sobre a variação da minha existência
quantos de mim já existiram
quantas contradições entre eles
quantos de mim se salvaram
em quantos mundos vivi
quanto tempo ___ quantos séculos
sendo a infância o tempo
mais longínquo antes da libertação
depois de vivo e consciente
quantos úteros conheci
infecundos
insensíveis
irresponsáveis
sou crente à minha maneira
creio na não existência de um deus
misericordioso e equilibrado
não tenho por isso a quem pedir nada
creio na minha individualidade
creio na presença dos outros ___
___ na minha solidão
abro a porta do armário
da que foi a nossa cozinha
retiro a chávena rosa ___
___ só uma
e fico-me a meditar
que útero tomará a seguir como sua
a outra chávena rosa.