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O homem espera que a sua planta ainda tímida
cresça
faz já muito tempo que o homem tímido rega a planta
com o seu pequeno regador tímido
o homem teme morrer antes de ver a sua planta
dar flor.
Somente os verdadeiros sofredoressão capazes de uma seriedade autêntica.Emil CioranInformo-te como é minha obrigaçãode que vou partira parte do meu corpo que ontem te entregueinão poderás ficar com elapara ti será apenas uma memóriadeixo-te as recordaçõesas fotografiasos poemaso meu frasco de perfume quase acabadoouvirás falar de mime a tua presença será solicitadatraz-me os meus sapatos do nosso casamento.
No princípio apenas o céu azulagoratudo o que me interessa é a coruma papoila ao soluma romã abertauns lábios vivosuma boca a cantarum raio que tudo iluminalágrimas de sangueuma bandeira vermelhao rosto do filho na noite de Nataluma rosa de Alexandriaa tua pele quando te desnudase o céu de novoda cor da noitecom o Quarto Crescente.
Uma pedra sobre o peitoo pulsar do sangue em cadência nos ouvidosa línguaos dentesa bocanuma imobilidade estranhapara não acordar a sombra do animalque dorme aos meus pésno cérebro um cardume de peixesno olhar um bando de avesentretantoescrevo as marcas no meu corpopara que se detenham as palavras inúteis.
Tenho chamado por ti vezes sem contaao longo da vidade vários nomes te fizesteem muitos silêncios te revipelas paredes ficaram versos inacabadosde um poema de amor que não resultoue durmopesa-me o corpo neste sonoe sonhocomo eu gostava de voltar ao tempoem que comíamos um cachorro quentenum restaurante modesto do subúrbioe sabíamos o nome um do outro.
Têm tantos dedos as tuas mãosem cada dedo um sonhoem cada sonho um rostoestendes-me a mão e perguntasse tenho saudadesdigo-teque não quero falar de coisas tristesembora tenha medo que feches as mãossobre a minha vontade quando choroentão peço-teque não me convenças da eternidade.
Deixei-te morrer Mariaporque me enganastequiseste interromper a lógica da vidae com a tua mentiraenganaste o mundoainda enganasa mim não ___ que conheço a funçãodesde que fiquei adultopara mim tudo ficou em ruínassobre as ideiase tu Maria já não existesnos nomes de todas as Mariasque nem sabempor que lhes deram o nomefoi por causa de uma mentirae por issoa desconfiança do homemse tornou eternaeste foi aplainando a mentiracomo se tivesse acreditadoem toda a históriaque está nos Livros do enganoa mim não Mariadeixei-te morrer.
Fui expulso da Alegriapor aqueles que mais se riamsilenciosos e previsíveisusam a boca apenas para comerde onde lhes escorre a gordura do pecadocom que salpicam as mamasdas suas damaslevanto-me e saio sem pagar a contanão sem antes lhes dizermais vale rir do que chorar.
O medofaz com que se adiem certas decisõesguardo-me para depoisvisto o sobretudo com a noite dentro
é noite de certeza
em todos os bolsos encontro estrelasadio a decisão de partire adormeço dentro da noitetalvez amanhã se faça diadentro do meu sobretudoentão partirei sem medo do escuro.