É tarde


Repara como os nossos corpos

ficaram menos belos. 

Dantes a nossa pele era lisa e fresca 

não tinha manchas escuras 

e estas rugas infindas 

que o tempo sabiamente marcou 

como tatuagens. 

E como ficámos parecidos 

as caras descaídas e sombrias 

com as expressões baças 

que em ti e em mim se assemelham

temos uma história no rosto 

as marcas do passado 

que ganhámos um com o outro. 

As nossas vozes outrora diferentes

ficaram semelhantes no tom de enfado

a tua menos doce 

a minha mais rouca e seca sem calor. 

Já não te afago porque não consigo 

apagar as tuas rugas com a minha mão. 

Os teus cabelos mais finos e sem cor 

parecem-se afinal com os que me restam 

depois dos vendavais da nossa vida. 

Há tanto tempo não adormecemos juntos. 


É tarde ___

___ tu já dormes 

e eu para aqui 

a matar o resto do tempo que se foi. 




 

35 comentários:

  1. Uma nova versão do poema anterior, mais melódica, mais realista, mais bela.
    Gostei imenso.
    Assim como gostei igualmente do caracol.
    Parabéns!

    Um abraço.

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    1. Muito me agrada que tenha valorizado esta versão. O caracol agradece.
      Até amanhã. Um abraço.

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  2. O mesmo tema, mas o poema de ontem era mais subtil.

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    1. Duas versões, duas formas de apreciar a realidade.

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    2. E qual destas versões ELA gostou mais?!

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    3. Na IDEIA de descrever a realidade com duas perspectivas — é que está a QUALIDADE do poema, sendo secundário qual toi o poema favorito 🐌

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  3. Ficou interessante esta versão 2.0... mas vou já dizendo que prefiro o texto de ontem.
    Sou uma romântica... e este texto chega a ser cruel lê-lo hoje depois de ter lido ontem o outro.
    Um choque de realidade!? Um ataque de honestidade?!
    Já sei, cada um que interprete à sua maneira!

    Gostei do caracol, levou-me à minha infância quando, acocorada do meio do jardim, esperava pacientemente que ele (o caracol) colocasse os corninhos ao sol!

    (^^)

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    1. Esta foi uma tentativa de mostrar como a mesma realidade pode ser descrita.
      Interessante como os gostos se dividem.
      Um abraço e obrigado pelo seu comentário.

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  4. É tarde ___
    ___ tu já a dormires
    e eu para aqui
    a querer enganar o tempo
    a querer matar o tempo
    afagando
    as rugas que me deixam
    a tua ausência
    _________________________

    Abraço largo!

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    1. As rugas são história mas a ausência de alguém também.
      Um abraço

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  5. Este comentário foi removido pelo autor.

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  6. Volto para alterar a minha opinião.
    Como ontem me dispersei com aquela parte do cabelo doado ao vento e o não voltei a ler, hoje praticamente fixei-me no final do poema.
    Relendo ambos, creio ser muito triste já não existirem afagos.
    Resumindo, vou ficar com o poema de ontem, adicionando-lhe o final de hoje:

    "Os teus cabelos mais finos e sem cor
    parecem-se afinal com os que me restam
    depois dos vendavais da nossa vida."

    Vamos fazer de conta que o leitor é quem escolhe, o que melhor lhe soa e agrada.
    Pode ser? Uma espécie de discos pedidos...

    Obrigada!

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    1. Estou de acordo e aceito que alterem, cortem e cozam com outro, o que quiserem, afinal como poderia eu impedir esse estímulo à sua criatividade?
      Eu é que agradeço essa participação atenta.

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  7. Não adormecemos juntos ou não dormimos justos — são dois pares de sapatos .. muito diferentes 🐌

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  8. A velhice e a forma como a vida nos consegue doer em tantos pontos

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  9. Sinceramente gostei mais do poema de ontem embora na verdade os dois me pareçam muito tristes. Como se os anos e as rugas acabassem com o amor que une duas pessoas. Não acredito nisso. O corpo envelhece, os sentimentos não. Nascem e vivem toda a vida, ou morrem por situações várias e dolorosas, mas nunca por causa do envelhecimento. É o que a vida me ensinou, nos 70 e tais que já vivi.
    Abraço e saúde.

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    1. Também acredito que em alguns casos seja assim.
      Obrigado pela sua opinião.
      Um abraço, saúde também.

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    2. Concordo em absoluto com a Elvira. Os sentimentos não morrem por causa do envelhecimento. Morrem pelo desencanto,egoísmo,arrogância e prepotência.

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    3. Apoiado/a...e o Amor morre precisamente de desencanto, nas vítimas desse egoísmo, arrogância e prepotência de quem se deixou enlear nas malhas de uma pele mais fresca e jovem, num corpo mais elegante. Aí, ainda bem que o Amor morre e liberta quem um dia o sentiu...

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  10. O poema deixou-me enternecida e a pequenina aguarela deixou-me fascinada. Esse seu caracol procura (e encontra!) todos os sóis do universo :)

    Abraço, L.

    PS - Não me pergunte onde se meteu a minha outra conta que, com estes meus imprestáveis olhos, perdi-lhe o Norte...

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    1. Gostei muito do seu comentário. Quanto à sua conta... não dei por nada, identifiquei-a logo.
      Muito Obrigado e um Abraço.

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  11. Chegar4 à velhice e poder vaguear assim pelo imaginário é simplesmente louvável. É lindo o caracol que procura o seu rumo. Será que o encontra?
    Cumprimentos

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    1. Obrigado pelo seu comentário. O caracol continua a procurar.
      Boa Tarde.

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  12. Veja só, caro anfitrião, o que assaltou agora esta minha cabecinha pensadora:

    Será que o caracol não está aqui de todo nada inocente nesta história, e sim para nos dizer da eficácia do retardar das "rugas infindas

    que o tempo sabiamente marcou como tatuagens", se usarmos o creme feito da baba do caracol?
    ...Hummm

    Vou, e hoje já não volto.
    Obrigada pela sua paciência.

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    1. Não tinha pensado nisso mas será decerto uma promoção para os caracóis que andam a babar-se por aí.
      Volte as vezes que quiser, do que eu gosto é desta tertúlia neste espaço.
      Muito Obrigado
      Um abraço.

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  13. Depois de ler sua postagem anterior, encontro, aqui, um outro lado do mesmo tema. Nesse poema há a tristeza e o desencanto advindo das ações do tempo sobre a pele, sobre a voz... envelhecimento inevitável, que pode o amor ignorar. Igualmente belo, embora traga frustração diante do tempo que se foi. Abraço.

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    1. Os dois textos sobre o mesma tema, duas formas de olhar para a mesma realidade conforme o estado de espírito e a envolvência sentimental.
      Obrigado pela sua visita. Um abraço.

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  14. Quando envelhecemos, com a sorte de ter quem amamos por companhia, acabamos por ficar parecidos, quer fisicamente quer no comportamento.
    Este poema é mais realista que o anterior, mas igualmente belo .


    Um abraço !

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    1. Uma sorte com que a vida premeia alguns.
      Obrigado pela sua opinião.
      Um abraço.

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  15. Regressei agora a casa ... e o caracol 🐌 continua aí todo catita!!

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    1. Os caracóis são seres tranquilos, Teresa...andam devagarinho, sem stress.
      Se viesses só amanhã ainda o verias aí à tua espera...

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