Foto do autor do texto





Poema que nasceu ao balcão da cervejaria


Sentado ao balcão num daqueles bancos altos ___

___ uma imperial a borbulhar impaciente

e eu a fazer contas nas costas de uma factura


Pergunto ao empregado atarefado e desatento

se sabe que os juros aumentaram ___

___ ele trouxe mais tremoços 

percebeu

Os tremoços acabaram! 


a inflacção também chega aos tremoços? 

perguntei-lhe

e ele apresenta mais tremoços 

percebeu

  Não chegam os tremoços! 


Bebo a imperial já farta de esperar por mim

e saio sem tocar nos tremoços 

Afinal a vida 

é um lugar de sucessivos mal-entendidos

e eu sou um modesto consumidor de prazer

do que se paga barato e sem compromisso

como beber uma imperial e

desprezar os tremoços 

Grave, grave é a factura que trago no bolso

é a vida a ameaçar-me de morte

e o coração assustado a dizer-me

que sou um homem pequeno

para um coração tão ambulante e insubmisso.





14 comentários:

  1. Muitos devem ter sido os poemas escritos aos balcões de velhos bares, no entanto, poucos tão sui generis.
    Entre mal-entendidos, deixou o poeta aquecer a cerveja e o poema por escrever...preocupado pelas coisas comezinhas da vida prática.

    Que o coração do poeta é como um povo nómada, que não assenta arraias nem se deixa submeter, já todos percebemos.
    Vai ver, é aí que reside o seu encanto... :)

    Um abraço.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Um comentário simpático, com uma análise correcta da ideia expressa no texto.
      A valorização de certas características que julga ter vislumbrando no autor e que classifica positivamente, pode ter uma avaliação negativa no julgamento de outros avaliadores.
      Agradeço a delicadeza e a atenção com que lê os meus textos.
      Um abraço.

      Eliminar
  2. Conheço demasiado bem o insuportável peso das facturas que todos - ou quase todos - trazemos nos bolsos.

    Tenho um coração profundamente gregário, embora insubmisso e tristemente remendado, que frequentemente se assusta com o peso das facturas e que, ainda por cima, não gosta mesmo nada de cerveja...

    Forte abraço, L.!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Achei muito bem disposto este seu comentário. Tem razão, na nossa contabilidade. desconfio que quando chegamos ao fim dos pagamentos a gaveta do dinheiro conserva uns dispersos euros que já não brilham. Foi a este estado que chegou o "negócio" na nossa "empresa".
      Um abraço.

      Eliminar
  3. 🍺 Cerveja é a bebida dos deuses e a minha — deusa insubmissa.
    O preço da cerveja subiu de tal maneira que uma bebedeira de cerveja 🍻 leva o ordenado do mês.
    Poema, que embora com humor, expressa o abismo da nossa existência.
    E os culpados não somos nós, são os „senhores da guerra“ ☠️ como o nosso amigo Rogério lhes chama!!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. O seu comentário, atento e bem analisado, enriquece o texto publicado com o que disse no segundo parágrafo.
      Na guerra estamos todos, as guerras dos outros também agridem a nossa vida e incompatibilizam-nos uns com os outros.

      Eliminar
  4. Não gosto de cerveja, mas gosto de tremoços...
    E gosto da sonoridade subjectiva deste poema diferente, com um final extraordinário.
    Aproximam-se tempos difíceis.
    Beijo.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Concordo, aproximam-se tempos difíceis, os entendidos em culinária, talvez devam começar a pensar em refeições à base de tremoço.
      Um abraço.

      Eliminar
  5. Não conseguimos fugir delas, todos os meses nos tocam na carteira.
    Gostei do que li.
    Bom fim-de-semana!

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. São várias e cheias de arestas... até dói e cada vez mais, para delícia dos que nos enviam as ditas facturas.
      Bom fim de semana

      Eliminar
  6. Todo se ha encarecido, en estos últimos años y es muy dificíl llegar a fin de mes.
    Besos.

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Aquí, como allá, el oportunismo del capital está encareciendo la vida. Un abrazo.

      Eliminar
  7. Os poetas gostam de um barzinho para compor seus versos e o boleto
    no bolso tira-lhe toda inspiração _ o garçon se fez de desentendido e te ofereceu
    os versos que faltavam para esquecer os juros da conta atrasada rsrs
    Bom fim de semana, L

    ResponderEliminar
    Respostas
    1. Muito bem conseguido este seu comentário, uma interpretação bem disposta.
      Um abraço.

      Eliminar