Ao acordar
Logo que acordo
mais minuto menos minuto
lá está o som irritante do relógio antigo
assim como quem trinca o tempo
na parede em frente
aquele quadro que foge à minha autoria
está sempre a mudar de cor
cores ferozes ___ por vezes
as manchas do tecto pintadas
pelo tabaco do anterior inquilino
massacram-me com a promessa
que fiz a mim próprio de o pintar
sentado na cama deito um olhar
para a almofada ao meu lado
um hábito que me ficou do tempo
em que ouvia alguém a respirar.
Estou ainda descalço
ponho os pés no chão frio
e dou conta da minha existência
numa perda tal de justificação
que até o meu nome me soa desconhecido
ou talvez nem tanto ___ apenas estranho
e tudo isto me enche o fundo dos olhos
com a possibilidade das lágrimas
que num esforço para me tornar lúcido
consigo conter ___ ou melhor
o que eu tento conter é o medo inexplicável
o mesmo medo de criança
das vozes altas ___ das reprimendas
agora tudo em silêncio portanto
medo do silêncio que foi
o que ficou na almofada ao meu lado.
O tempo tudo transforma no seu mastigar
dos dias dos meses e dos anos
numa espécie de banquete invisível
onde somos nós os consumidos
sem nos darmos conta e sempre
na grande dúvida do que virá a seguir.
Um estranho instalou-se no meu cérebro
e lá continua a viver.
Hay huellas del pasado, que vienen a la mente y no se pueden reprimir.
ResponderEliminarBesos.
Cosas que creemos haber olvidado. Un abrazo.
EliminarTão belo...tão belo o triste Poema.
ResponderEliminarAinda que a medo, quase me reconheço nessa realidade.
Felizmente, a bem da minha sanidade mental, falta-me o "quase"....
"Quase" ter-se reconhecido no texto de hoje, quer dizer, objectivo alcançado pelo autor, tocar a sensibilidade do leitor. Obrigado.
EliminarEmbora não me tenha reconhecido no poema de hoje, é um dos seus melhores poemas.
ResponderEliminarAo acordar admiro a aguarela do poeta, na parede ao lado esquerdo da cama.
Abro a janela, mesmo no inverno, e digo simplesmente „bom dia, alegria“ 🍀
É agradável para o autor, saber que há partículas da sua criação a conviver com os seus leitores. É uma forma de se saber acompanhado.
EliminarUm Poema brilhante! Mesmo sendo nostálgico.
ResponderEliminarO último verso despertou-me imensas sensações, por isso, li e reli e voltei a ler...
Caro Anónimo, o seu comentário sensibilizou-me, obrigado.
EliminarHavemos de falar deste teu poema
ResponderEliminarolhos nos olhos
Talvez amanhã... porque não?
Dá-me angústia a tua depressão
Quando acordar, ligo-te
Está combinado.
EliminarAchei muita saudade, para não dizer sofrimento neste poema.
ResponderEliminarA vida e a solidão é dura. Muito dura.
A mensagem passou, mas fiquei com o coração apertado.
:(
É um elogio quando um leitor me diz que se emocionou. Muito obrigado.
EliminarUm abraço.