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Nós os dois


Há uma estranheza quando me ocorre

que já nos amámos 


que acordávamos despenteados e sorridentes

que bebíamos pelo mesmo copo

que tínhamos na mão o mesmo livro

que nunca foi preciso abrir a porta ao outro

porque já estávamos dentro do outro

que sempre fizemos o nosso lume

com a fricção do nosso desejo


Espanto-me quando me ocorre

que já nos amámos

nesse tempo a poesia era a nossa forma

de não desperdiçar o espírito 

até que os espíritos se tornaram fantasmas


Agora estou em fuga da minha memória 

escrevo para me confessar

e isto não é uma metáfora.



 

12 comentários:

  1. Ainda bem que não é uma metáfora.
    Gosto desse sentimento que acomete
    o poeta e nos deixa ver que nos
    interstícios da vida há ou houve algo
    que vale a pena.
    Um abraço
    Olinda

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    1. Conforta sermos capazes de revelar certos momentos mais sensíveis da nossa vida.
      Um abraço.

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  2. Bom dia
    Gostei da maneira como se confessa . Talvez a adote.


    JR

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    1. Confessar a quem merece as nossas confissões humaniza a nossa vida.
      Um abraço.

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  3. O poeta conquista a nossa simpatia de um modo imediato da maneira como se confessa.
    As nossas confissões humanizam a nossa vida, diz o poeta.
    Provavelmente as nossas confissões também fragilizam as nossas vidas.

    A escadaria da fotografia lembra-me a minha cidade invicta.

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    1. As confissões são uma entrega mas nem todos merecem essa entrega.
      A foto é no Porto, sim.

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    2. Teresa Palmira Hoffbauer22 de julho de 2023 às 21:49

      Provavelmente a anónima das margens do rio Reno não merece as confissões do poeta.

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  4. Uma confissão poética muito bela, recordando um grande amor.
    Um poema excelente que muito apreciei.
    Beijinhos,
    Ailime

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    1. Uma confissão lançada para o desconhecido.
      Obrigado.
      Um abraço.

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    2. Havia, até um não há muito
      um outro "Nós dois" quase assim

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  5. Um confissão, que encerra um grande amor.
    Nada foi esquecido.
    Está tudo no poema.
    :)

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