As despedidas
Comecemos as despedidas
nas malas não levaremos mais do que
vultos impudicos desnudados
uma pedra de cada cidade visitada
o odor de um cais abandonado
os troféus invisíveis das nossas aventuras
os suspiros coloridos dos que amámos
mas também
a mágoa dos que não gostaram de nós
ficarão as fotos de como fomos felizes
no tempo em que todos neste lugar
éramos crianças
partiremos no dia em que começarem
a cair as folhas de Outono
e nessa liturgia de decompor o tempo
renasceremos num lugar quase novo
e na parede teremos um novo calendário
em que nenhum dia terá início
e em que nenhuma noite terá fim.
O poeta diz adeus com todos os sentidos.
ResponderEliminarUma perspectiva curiosa tanto do poema como da fotografia.
O autor pretende desaparecer numa pequena nuvem de fumo.
EliminarBoa tarde Luís,
ResponderEliminarUm poema belo e muito profundo.
Construção e inspiração perfeitas.
Beijinhos,
Ailime
Dias em que "a coisa" corre melhor no que diz respeito à escrita.
EliminarUm abraço.
Um rol de situações bastante plausíveis, ou seja,
ResponderEliminarque podem acontecer a qualquer um de nós.
Os dois últimos versos é que nos põem a pensar:
e gosto desse "absurdo" que o acomete ao finalizar
muitos dos seus poemas.
Um abraço
Olinda
Esse absurdo para finalizar os meus textos é uma "pincelada" a que não resisto.
EliminarUm abraço.
não gosto de despedidas nem da palavra Adeus,
ResponderEliminaré curioso, como este poema me lembrou de um do Poeta José Gomes Ferreira.
sem querer ser indelicada aqui deixo.
Devia morrer-se de outra maneira.
Transformarmo-nos em fumo, por exemplo.
Ou em nuvens.
Quando nos sentíssemos cansados, fartos do mesmo sol
a fingir de novo todas as manhãs, convocaríamos
os amigos mais íntimos com um cartão de convite
para o ritual do Grande Desfazer: "Fulano de tal comunica
a V. Exa. que vai transformar-se em nuvem hoje
às 9 horas. Traje de passeio".
E então, solenemente, com passos de reter tempo, fatos
escuros, olhos de lua de cerimônia, viríamos todos assistir
a despedida.
Apertos de mãos quentes. Ternura de calafrio.
"Adeus! Adeus!"
E, pouco a pouco, devagarinho, sem sofrimento,
numa lassidão de arrancar raízes...
(primeiro, os olhos... em seguida, os lábios... depois os cabelos... )
a carne, em vez de apodrecer, começaria a transfigurar-se
em fumo... tão leve... tão sutil... tão pòlen...
como aquela nuvem além (vêem?) — nesta tarde de outono
ainda tocada por um vento de lábios azuis...
É, de facto, um grande poema... de um grande poeta. Agradeço a gentileza de o ter reproduzido.
EliminarUm abraço.