Carta para um amigo que desapareceu 


Sonhei que me tinhas telefonado

três anos depois

vê lá que curioso

três anos depois no mesmo dia 

em que desapareceste 

telefonaste assim sem mais nem menos

como se nada tivesse acontecido

entre nós para sempre

e ainda ontem tivéssemos falado

leste-me ao telefone

uma carta para um amigo que desapareceu 

que querias publicar no jornal da tua terra

e eu calado ouvia ___ como sempre

que escrevias uma carta a alguém 

e me a lias para eu dar a minha opinião 

senti-me contente ___ acredita 

e livre de um nó na minha vida

que não conseguiria desfazer nunca mais

nunca mais 


até acordar e perceber o sonho

desencantado senti ainda o nó no meu peito

quem sabe um dia destes

me seja entregue pelo correio

essa carta-abraço igual à minha

que não sei para onde enviar.



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Bernard Pivot

1935 - 2024




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O poema hoje publicado não se refere ao desaparecimento de Bernard Pivot. 


 

10 comentários:

  1. Poema realista de uma amizade desencontrada.
    Sigmund Freud a analisar o sonho.
    A letra do poeta é linda de morrer.
    A minha letra é tão redonda, quase infantil.
    Summa summarum: gostei da publicação desta noite.

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    1. Um comentário positivo à publicação de hoje. Fico contente.

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  2. Adorei a carta que fizeste e emocionei-me. A tua letra é de advogado:)
    Beijos e uma boa tarde

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    1. Muito obrigado. É um elogio para mim que os leitores se emocionem.
      Um abraço.

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  3. Adorei o Poema.
    Há sonhos e sonhos!
    Este é uma premonição.
    E assim o nó na garganta vai desaparecer.
    :)

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  4. Luiz Gomes deixou um novo comentário na mensagem "":

    Boa tarde. Aproveito para desejar uma excelente terça-feira meu querido amigo Luís. Acho que tenho muitos amigos que sumiram, no decorrer da história da minha simples vida. Escrever carta hoje em dia é coisa rara, ainda tenho algumas guardadas, que para mim, são verdadeiras riquezas.

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    1. Olá Luiz
      É verdade, os amigos vão desaparecendo, de um modo ou de outro.
      Grande Luiz, um abraço deste lado da Terra.

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  5. Tal como a Teresa fiquei presa na beleza da caligrafia:)

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