Foto de Daniel Filipe Rodrigues
No princípio o meu céu e a minha terraestavam sem ordem e eu estava sozinhocomprei um peixe vermelhopara me fazer companhianesse vazio projectei um museupara que existisse ordem e luz sobreos acontecimentos do século passadoda minha longa vidaa luz escondia-se entreos papéis manchados com palavrase dobrados de esquecimentocom zelo e surpresa foram justapostossobre o meu estremecimentoainda não tinha nome para o queme ia surpreendendo o lepisma comeutodos os nomes escritosem cartasem postaisno verso das fotografiasa todos dei então novos nomescom palavras de que gostoe entre eles os liguei comartigos definidose indefinidospreposiçõesvírgulase outros complexos artifícios da línguae eis o museude que sou o único visitantefinda a tarefa encerro as portase vou tirar o peixe vermelho da águaantes que se afogue.
Fica-se impotente perante a inércia...
ResponderEliminarBeijos e abraços
Marta
A inércia, quando não exagerada, somos nós a descansar.
EliminarUm abraço.
Li e reli e não percebi este teu poema o que peço desculpa!
ResponderEliminarBeijocas e um bom dia
Nada a desculpar. Por vezes nem eu me compreendo, os leitores com os seus comentários ajudam-me a compreender-me.
EliminarUm abraço.
Pois eu vi-o muito claramente a cerzir as peças que o lepisma danificou, L., não tivesse eu também uma cidade/museu dentro de mim.
ResponderEliminarQuanto à imagem da carpa vermelha, pode nem sequer sequer representar um peixe. Assim sendo, convém retirá-lo da água e devolvê.lo à sua dimensão. Não resisti a roubar-lhe a fotografia...
Um forte abraço, L.
Afinal há mais quem traga um museu dentro de nós.
EliminarPode levar a foto.
Um abraço.
Boa noite Luís,
ResponderEliminarOutro poema magnífico e comovente.
O museu que guarda dentro de si é decerto a história da sua vida, a cujos capitulos deu novos nomes.
Desta forma sentir-se-à mais acompanhado e liberta o peixe para que ambos possam respirar.
Beijinhos,
Emília
Todos transportamos o nosso museu, por vezes sem darmos conta disso.
EliminarUm abraço.
© Piedade Araújo Sol (Pity) deixou um novo comentário na mensagem "":
ResponderEliminarBoa tarde Caro Pintor, Poeta e Fotógrafo
Um poema inusitado e repleto de camadas:
Este poema é uma viagem surreal pela tentativa de dar ordem ao caos – um tema profundamente humano. A solidão inicial e o peixe vermelho como companheiro são metáforas que sinalizam a fragilidade e a busca por sentido. O museu, projectado para trazer luz aos eventos do passado, torna-se um espaço onde a memória se organiza, mas também se desintegra, corroída pelo lepisma que devora nomes e histórias.
A reconstrução dessa memória com "palavras de que gosto" sugere uma reescrita da própria identidade, um gesto de criação que é tanto pessoal quanto artístico. No entanto, o final desconcerta: ao tirar o peixe da água, o eu lírico subverte a lógica, talvez indicando que, no universo do absurdo, nem mesmo o ato criativo pode escapar da finitude. Este é um poema que desafia tanto a lógica quanto o leitor, revelando o poder das palavras como ferramenta de ordem e caos simultaneamente.
Espero ter desintricado o âmago do poema.
:)
Gostei muito da sua análise, gostei de tudo o que disse. Até a mim me ajudou a compreender melhor o que deixei escrito.
EliminarObrigado.
Um abraço.