Testamento 


Textos condenados a serem 

nada ___ a desaparecerem

foi o que vos deixei

o resultado do exercício das mãos 

vassalas da vontade da minha razão 

com eles ___ silenciosamente

resisti ao tempo que tudo engole


já será honroso ficar

num canto dobrado de uma página 

onde o leitor voltará ___

___ quando voltarem lembrem-se

que continuo no limbo 

e tive a imodéstia de cantar

a angústia 

a inquietude 

o desgosto 

o arrependimento 

Talvez seja lembrado como aquele

que falou de tudo isto que é de todos 

sem que os próprios o saibam

até me lerem


Por favor não fumem

enquanto estão comigo

o último fumo foi o meu fim.




 

6 comentários:

  1. A pintura __ que é linda de morrer __ não ofusca o poema que leva para o túmulo o último cigarro do poeta.
    A minha crítica é entusiástica.

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    1. A sua crítica ajuda a percorrer o caminho da arte até ao consumo do último cigarro.

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  2. 'Com cinco ou 6 retas é fácil fazer um castelo'
    ... nessa linda passarela das suas aquarelas. Amo muito !
    O fim é sempre por um triz ,não importa se com cigarro ou não.
    Abraço ,L

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    1. Agradeço o seu comentário simpático.
      O fim é uma palavra num écran preto.
      Um abraço.

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  3. Tão belos, pintura e poema, L.!

    Como já não vejo tão bem quanto quereria, fiquei na dúvida entre o pastel de óleo e o pastel seco na árvore, na casa e no túmulo sob a casa...
    Também fiquei na dúvida quanto ao sujeito poético. Não sei se fala de si ou se dá voz a uma terceira pessoa...

    Faço de conta que não ouço o apelo final. Às vezes daria tudo o que tenho e não tenho por um simples cigarro:

    PÉS DE BARRO
    *


    Dar-vos-ia o que tenho, nada tendo:

    O intenso travo a sal do mar que sou,

    A fonte de onde o verso me brotou,

    As mãos com que me rasgo e me remendo,
    *

    A dúvida, a certeza e quanto entendo

    De uns nadas de que a vida me dotou,

    A beleza que tive e já murchou,

    A musicalidade a que me prendo,
    *

    A rosa, o espinho, a força, o estro, a chama

    E tudo, tudo aquilo a que me agarro

    Pra manter-me de pé, fugindo à cama...
    *



    Poeta sobre frágeis pés de barro,

    - que mil vezes prefiro a ´mãos com lama`.. -

    Eu dar-vos-ia o céu... por um cigarro!
    *

    Maria João Brito de Sousa


    20.01.2017 - 16.11h
    ***

    Forte abraço!

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    1. Muito belo o poema que aqui me deixou.
      Conseguiu muito bem identificar a técnica do trabalho que apresento.
      Um abraço e muito obrigado pelo poema.

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