Sessenta anos é muito tempo
Sessenta anos depois encontrei-te casualmente
na mesma mesa do mesmo café da nossa juventude.
Tudo diferente. Outras cores nas paredes
as montras com garrafas tinham desaparecido
havia música de fundo ___ repetitiva mas calma
a Jukebox já não estava lá, as cadeiras e as mesas
eram todas modernas. Onde dantes se tomava café
com açucareiro e copo de água e se comiam bolos
servidos em pratos de meia-dúzia que vinham e voltavam
havia agora toalhetes de papel e uma ementa alegre.
Outros aromas, outra luz.
Apenas duas ou três mesas para os clientes de café.
E lá estavas tu ___ mas eras outro, igual apenas
nos óculos de vidros possantes com armações pretas.
Cheguei-me e disse-te -Olá Zé.
tive o cuidado de não te chamar Vidrinhos
olhaste-me surpreendido ___ ou não
ou talvez apreciando a minha falta de cabelo
como a tua, aliás, e disseste -Quem é o senhor?
achei que brincavas como fazias dantes que até parecia
estares a falar a sério. Disse-te que era eu, o outro Zé
o Canhoto para ver se achavas graça ___ mas nada,
disse-te que compreendia que não me reconhecesses
sessenta anos depois.
Baixaste a cabeça.
Por momentos duvidei que fosses a pessoa certa.
Uma voz por trás de mim, de um homem
parecido contigo em mais novo disse
-Ele já se esqueceu de tudo.
Respondi -E eu, se calhar, também.
Uma recordação profunda e sentida
ResponderEliminarMomentos em que a memória se afunda.
EliminarDe facto sessenta anos é muito tempo e narras muito bem esse passar do tempo porque tudo muda até nós.
ResponderEliminarA minha irmã mais velha e o marido anualmente vão a almoços para o pessoal dos tempos da escola, do bairro, etc, aos quais nunca fui . Muitos e muitas perguntam por mim e ela mostra uma foto minha mais recente e a resposta é sempre esta: se a visse reconheceria logo. Pudera eu era mais conhecida que " a batata frita" e passados todos estes anos recordo apenas de uns quantos que já os vi por cá e eles ou elas é que me reconhecem e eu fico a patinar porque não os reconheço e são eles que me relembram.
Gravados e bem gravados por tudo que fizemos em Luanda gostaria de saber do "Mekui, do Fanfurra do Xupeta" e da Branca Clara da Neves" que esta encontrei-a apenas uma vez no Tribunal da Boa Hora em Lisboa, foi um festival e sendo ela preta com este nome a sua alcunha era "Suspiro".
Gostei muito de vir aqui e a foto é maravilhosa.
Beijos e um bom sábado
As nossas memórias, não sei se será boa ideia agitá-las.
EliminarPor aí há memórias muito vivas de tempos que não será fácil esquecer... compreendo.
É verdade, a batata frita deve ser a recordação mais comum, para os mais jovens talvez também a pipoca.
Bom fim de semana, um abraço.
Este seu texto emocionou-me deveras. Sabe como é aquela emoção que nos chega sem esperarmos, desprovida de lágrimas, que nos bate no peito e penetra na alma? Pois é! Foi assim que cheguei ao final da leitura da sua publicação de hoje...
ResponderEliminarPode este texto até ter sido escrito sem qualquer reminiscência real, apenas para "dar voz" à fotografia, mas isso que importa se não impede que eu me emocione?
Um abraço!
Esse é o desejo do autor, a emoção é a mais nobre oferta que me podem fazer depois das minhas publicações serem visualizadas e lidas.
EliminarDespeço-me com uma vénia de agradecimento pela sinceridade.
Cada vez estou a gostar mais destas despedidas sempre diferentes em cada resposta sua, Luís. 👍
EliminarQue maravilha! Sinto-me uma privilegiada. 😊
Acho que também vou seguir os seus passos e deixar-me de abraços rotineiros e...insípidos.
Como dizem os nossos irmãos brasileiros...me aguarde. 😅
Dolorosa enfermedad es la del Alzheimer. Sobretodo para los familiares.
ResponderEliminarFeliz fin de semana. Besos.
Sin duda, un flagelo para el paciente y la familia. Un abrazo.
EliminarHoje saio em silêncio, demasiado emocionada.
ResponderEliminar:(
Tomo como um elogio. Obrigado.
EliminarMemórias profundas e muito emocionantes.
ResponderEliminarBeijinhos
A vida vai deixando as suas marcas.
EliminarUm abraço.
Um longo poema que nos deixa um nó na garganta...
ResponderEliminarUma das mais profundas marcas que a velhice pode deixar em alguém é mesmo a total ausência da memória das marcas.
Forte abraço, L.
A doença come as nossas memórias.
EliminarAs melhoras, um abraço.