Memórias
Poderia talvez escrever as minhas memórias
Não daqueles diários belos e tranquilos
em que tudo está certo
com infâncias felizes e uma vida abastada
com histórias bem dispostas de famílias grandes
coniventes e bem sucedidas
Poderia talvez escrever as minhas memórias
Mas em páginas nada belas nem tranquilas
com tempos e lugares errados
com uma infância assassinada
com mosaicos de atitudes e decisões falhadas
e com pedras em falta que estragaram o desenho final
com noitadas impuras vividas à luz do dia
e muitos corpos dissolvidos em fogos
que explodiam à mínima falta de paciência
louça suja
copos vazios
camas desfeitas
mãos desencontradas e unhas roídas
árvores de natal nunca acabadas
correrias e chegadas sempre tardias
foices perdidas na ceifa
Histórias que encheriam páginas
com a vertigem da velocidade
de um comboio desgovernado
desobedecendo a todos os sinais da prudência
colhendo quem se cruzava
na passagem sem guarda
no tempo incerto
Pior ___ talvez o Diário Remendado do Pacheco
Escreverei sim sobre a vida em pequenas doses
para que não nasça de repente e irreversível
toda a crueldade das palavras.
Poema forte, profundo, belíssimo!
ResponderEliminarEm pequenas doses o poeta desabafa, espanta e encanta.
Será?!
Beijo.
O autor agradece a paciência e a atenção. O autor mistura o real e o imaginário, mistura o que pode.
EliminarUm abraço.
O poeta ama saborear as suas memórias, mesmo quando essas memórias não são belas e tranquilas.
ResponderEliminarMas quem quer ler as tediosas memórias de infâncias felizes❓
O poeta mergulhou novamente nas noites impuras do passado longínquo … e escreveu algo de magnífico.
A cadeira de criança é o testemunho das noites de orgia dos impressionistas franceses.
As noites que esconderam dias sombrios.
EliminarEsplêndido poema, L.!
ResponderEliminarComo Luís Pacheco, opta por escrever em pequenas doses "para que não nasça de repente e irreversível/toda a crueldade das palavras".
Quase todos nós, poetas, o vamos fazendo e eu, tal como Pacheco, conheci a Fome em determinada altura da minha vida, embora tivesse tido uma infância privilegiada. Mas nunca escreverei as minhas memórias e aquilo que trago literalmente Remendado é o coração.
Forte abraço!
Mais uma para o grupo, tudo em pequenas doses para que seja suportável.
EliminarUm abraço.
A ductilidade entre a dor e o amor...
ResponderEliminarImpressina-nos sempre!
Em ambos registos.
Faz Bem à sua Alma escrever e a todos nós o ler...
Deixo-lhe uma música para o fazer um pouco mais Feliz:
https://www.youtube.com/watch?v=0lhetFOJ5IE
O autor sente-se compensado quando um leitor sugere que a leitura feita aqui "lhe faz bem à alma"
EliminarOuvirei a música
Obrigado.
E ainda estas músicas, que têm tanto significado para mim!
ResponderEliminarEspero que aprecie.
https://www.youtube.com/watch?v=FzmElxZ3pNk
Apreciarei.
EliminarObrigado.
Se eu puder evitar que um coração se parta,
ResponderEliminarEu não terei vivido em vão;
Se eu puder evitar a agonia duma vida,
Ou acalentar uma dor,
Ou assistir um desfalecido melro
A voltar a seu ninho,
Eu não terei vivido em vão.
Emily Dickinson
Um autor que pertence ao grupo dos geniais.
EliminarPuede que al escribirla, te libere del peso que llevas dentro.
ResponderEliminarBesos.
Estoy de acuerdo, escribir es una liberación. Un abrazo.
EliminarUm poema muito intenso que me reporta para as minhas memórias, diferentes mas igualmente sofridas.
ResponderEliminarAbraço, saúde e bom domingo
As nossas memórias são uma grande fonte de inspiração.
EliminarUm abraço. Bom domingo.
Gostei bastante!:))
ResponderEliminarBeijo. Bom fim de semana.
Muito obrigado.
EliminarBom fim de semana.
Um abraço.
Intenso, com um bom guião até daria um bom filme.
ResponderEliminarA minha talvez nem com um bom guião, seria talvez insonsa e no final ninguem morria, iam todos voar sobre o mar. como as gaivotas.
:)
Quem escreve e fotografa não tem uma vida insonsa.
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