É tarde para ilusõeso treino da vida habilita-nos a viveraprendia respirar lentamentea perceber que o coração é cegoa esconder da mão esquerdao que faço com a direitaa ouvir com um ouvidoe a silenciar com o outrojá não acredito em novas floresserei imperfeito ___ agoramas é assimeu sou este e o outro que eu sou.
Foto do autor do texto
Um peixe inconsciente procura um lugare cruza inadvertido um raio de luzque costuma ser terrestremas que nuvens desviaram a sua incidêncianão saberá o peixe que a respiração do mundoé uma enorme guelra por onde se escoa o diae que o Deus que ali vivee que tudo ordena e desordenalhe concedeu esse último raio de luzantes do sacrifício que ele como deus concebeupara todos os peixes e animaispara todos os homenspara todos os outros deuses.
Foto de Ana Luís Rodrigues
Digo-te
nascer
como se dissesse
quero-te
como se fosse
fácil
o mesmo que dizer
minha
digo-te
olhos
como se dissesse
existo
como se fosse
claro
o mesmo que dizer
dia
digo-te
vontade
como se dissesse
fome
como se fosse
essencial
o mesmo que dizer
montanha
dizes-me
palavras
como se dissesses
delírio
como se fosse
areia
o mesmo que dizer
adeus.
Foto de Daniel Filipe Rodrigues
Pudéssemos ter na boca uma luze que isso não fosse entendido como uma doençae que isso fosse entendido como uma nova formade falar dos pensamentos em luzes e em corese também em palavras mas sempre luminosasque essa fosse uma forma de entendimentoentre os vivos e aqueles que são condenadosapenas por estarem vivos e não terem palavrase que desde logo as criançasfossem respeitadas na sua forma luminosa de falarque apenas as cores definissem o estado de espíritosem necessidade da fealdade dos rostosna controvérsia e na contrariedadeque a polémica fosse um arco-írisuma forma de arte ___ a decoração do mundose pudéssemos ter na boca uma luz em cada falaseríamos a luminosa respiração do mundo.
Imagem IA de Artguru
A minha gaguez é a vontade que tenhode não falar nunca maissurpreendi-me com um anjo que aterrou no meu jardime que começou a comer as flores uma a umacom intervalos para um bater de asasnesse bater de asas levantou um pó cor-de-rosaque coloriu a luz que iluminava a cenapor que o fazes?pergunteio anjo respondeu longamente com palavras própriasnuma linguagem que não foi clarae de cada vez que eu o interrompia para lhe dizerque não entendia ___ ele falava mais altona sua linguagem própria desconhecidae eu gesticulava e insistia no meu protestoassim estivemos até de madrugada _____ o anjo saciado da sua necessidade de se florirvoou até ficar oculto pela escuridãotossi por ter inspirado a nuvem de pó cor-de-rosae foi assim que fiquei gago e sem vontade de falarnunca mais.
Foto de Daniel Filipe Rodrigues
O tempo teimosoinsiste em ir além da minha vontademesmo quando tomo a tua mãoe o tempo pára para nósele continua célere no meu sanguee grita silenciosamentebatendo nos murosdo meu coraçãodos meus pulmõesdo meu cérebro inconstanteos deuses que ignoramosconduzem o tempomãos anónimas dão de comerà nossa vontadeao desejo assim chamadopelos que fecundaraminventores de céus e montanhasde mares e buracos negrosaqueles que são eternose nos obrigam ao tempo teimosoo tempo desce a escadaouço-lhe os passos ___ é tardetermino o poema.
Sanguea vida invisíveltão puro quanto o dos impurosdos que derramam o sangue dos purosos que fazem e pervertemas suas próprias leissanguea vida invisívelque multiplicamos sem razão que se conheçasangueque ferveque congelaque ignora o temormas que se escoa céleresangue doce que de tão docemorre antes de nós ___ lentamentesanguea vida invisívelo único atestado que comprovaa nossa possível eternidade.
Foto do autor do texto
Confesso-te que me encantavestir as tuas camisas perfumadassei que os botões pedem a minha mão direitaa mesma que desaperta os teus botõese o mais que é necessáriopara tocar o lugar onde guardas o coraçãocom que encho a minha mãoconfesso-te que me arrepia a pelevestir as tuas camisas perfumadase sentir ainda o teu peito sobre o meutive acanhamento quando comecei a gostarde vestir as tuas camisas mas perdi-oquando começaste a vestir as minhasagora sabemos que foi assimque nos ensinámos a viver um dentro do outromesmo quando estamos sem camisa.
Foto de Daniel Filipe Rodrigues
Uso o meu nome como um códigoespero ser reconhecidoquando me apresentar na fronteiraentre o meu e o outro temponada será então mais naturaldo que entrar pelo tempo dentroe perder a consciênciase não for reconhecidohaverá silêncio e trevase a incompreensão será um insulto.
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